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30/06/2022 11:30

Aborto legal: tudo o que você precisa saber sobre esse direito

O direito ao aborto legal é garantido por lei há mais de 80 anos para gravidez causada em decorrência de estupro, quando há risco à vida da gestante ou em caso de anencefalia do feto. As duas primeiras condições estão registradas no artigo 128 do Código Penal, enquanto a última passou a ser permitida em 2012, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Por outro lado, o Código Penal ainda criminaliza pessoas que fazem o aborto ou concordam que uma outra pessoa seja submetida, como aponta o artigo 124. A pena prevista nesses casos é de um a três anos de detenção.

Diferente de quando o procedimento é feito de forma ilegal, neste caso a lei exige que um médico realize o procedimento no hospital de forma gratuita pelo Sistema de Único de Saúde (SUS). Caso ele não queira por motivos pessoais, outro profissional deve estar disponível para executar o procedimento.

A descrição da lei vai na contramão do atendimento oferecido à criança de 11 anos em Santa Catarina, que foi estuprada e teve o aborto negado no Hospital Universitário de Santa Catarina. Segundo a instituição, o protocolo da unidade não permitia o procedimento pelo fato da vítima estar com 22 semanas, quando a família descobriu a gravidez e a violência. No entanto, o Código Penal não determina um limite para interromper a gravidez nesses três casos permitidos.

Ainda que subnotificados em sua maior parte, os dados sobre aborto no Brasil mostram que ainda há um longo caminho a ser percorrido para garantir esse direito à mulher. Um leventamento do G1 a partir de dados do SUS obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) identificou que cerca de 40% das mulheres que fizeram um aborto legal no país entre janeiro de 2021 e fevereiro deste ano viajaram para um município diferente do que moram, o que mostra como o julgamento ainda é um peso.

O lamentável cenário do estupro no Brasil

Apenas em 2021, 66.020 estupros foram praticados no país, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta terça-feira, 28.06. O dado mostra um aumento de 4,2% do crime em relação ao ano de 2021. “Tivemos uma queda nos casos de violência contra mulher e vulneráveis de março a maio de 2020, começo da pandemia, por conta da subnotificação. No entanto, em 2021, já observamos essa retomada para a média antes do período pandêmico”, explica Isabela Sobral, pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

De acordo com a especialista, o acesso aos dados sobre aborto são restristos, já que o Anuário colhe informações dos registros de ocorrências feitos nas delagacias dos estados do país. Com isso, o levantamento de procedimentos feitos em unidades de saúde não são computados. “O estupro especificamente tem uma taxa de notificação menor, segundo estudos internacionais, possivelmente em decorrência da gravidade que a vítima é exposta”, reflete.

O levantamento ainda apontou que vítimas negras seguem sendo a maioria, tanto no caso de mulheres quanto de vulneráveis. Segundo o Anuário, uma mulher afrodescendente tem 11% de chances a mais de ser estuprada no Brasil do que uma mulher branca.

Para a Emanuelle Góes, pesquisadora do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs) da Fiocruz Bahia, esse alvo é explicado pela lógica da estrutura racista que as mulheres pretas e indígenas enfrentam da infância à vida adulta em relação aos seus direitos reprodutivos. “Meninas negras são as que mais sofrem abuso infantil. Isso está associado ao racismo patriarcal, que as hipersexualização e dissemina a ideia de que é permitido tocar em seus corpos, criando um processo de culpabilização das vítimas”, explica Emanuelle.

A criminalização do aborto, ainda que com suas excessões em que interrupção é permitida, cria uma atmosfera de proibição coletiva, na visão da pesquisadora. “Mulheres que teriam o direito de fazer o aborto legal acabam recorrendo ao método ilícito por medo. Além disso, temos um presidente que contradiz a lei ao afirmar que toda forma de aborto é ilegal”, afirma Emanuelle, que aponta o impacto dessa repulsa ao aborto na negligência médica e juridica.

Em sua tese de doutorado, a pesquisadora identifica que mulheres negras, que já são as principais vítimas da violência obstétrica, tardam a procurar atendimento para fazer o aborto legal, o que implica no risco de vida dessas pessoas. “Nós já somos criminalizadas em nossa existência, mas, no contexto do aborto, a violência se agrava”, pontua.

Onde buscar ajuda

O primeiro passo após sofrer um estupro ou descobrir uma gravidez causada pela agressão sexual é procurar um hospital para receber um atendimento adequado e multidisciplinar. Na unidade de saúde, seja ela particular, seja da rede do SUS, não é necessário apresentar Boletim de Ocorrência ou qualquer outra comprovação. A palavra da vítima ou a autorização do responsável legal, no caso de menores de idade, é a única coisa necessária. Em seguida, um termo de consentimento deverá ser assinado.

Todos os hospitais que possuem área de ginecologia e obstetricia devem realizar o agendamento do aborto. No entanto, a realidade não é essa e a negação ainda acontece em larga escala. Por isso, o Mapa Aborto Legal reúne todos 176 hospitais da rede do SUS que oferecem o procedimento no país.

Em caso de risco à vida da parturiente ou anencefalia do feto, o aborto é feito mediante laudo médico e exame de ultrassonografia, para comprovar a anencefalia.

O que fazer caso o hospital negue o aborto?

Segundo Silvia Chakian, promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo e integrante da Promotoria Especializada de Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar do Ministério Público de São Paulo, a vítima ou o responsável legal deve procurar as autoridades. “A negativa precisa ser justificada e a mulher pode acionar o Ministério Público (promotoria de justiça) ou Defensoria Pública para comunicar o ocorrido e as providências cabíveis sejam tomadas”, pontua Chakian.

Caso o profissional de saúde recuse fazer o procedimento por alegação de objeção de consciência, ou seja, por questões pessoais, “ele tem obrigação de encaminhar para outro profissional fazer o aborto. A alegação de objeção é questão do foro individual e não justifica a negativa do serviço de saúde”, garante a promotora.

Se o aborto for negado à parturiente que corre risco de vida, o médico pode responder por omissão e seus desdobramentos.

Como a interrupção da gravidez é feita?

Há formas diversas para interromper uma gestação, como por meio de medicamentos, aspiração uterina elétrica ou manual. A decisão de qual opção será realizada é feita pela equipe médica responsável pela vítima e com consulta à paciente, segundo o Ministério da Saúde, visando sempre o bem-estar físico e mental dela.

Quais são os direitos garantidos às pessoas que realizaram o aborto legal após o procedimento?

A lei 12.845/13 exige que vítimas de violência sexual sejam atendidas com prioridade, em situação de emergência e multidisciplinar. Segundo Silvia Chakian, em todos os casos, deve ser garantido à pessoa também o direito à privacidade e respeito à sua dignidade.

Como registrar casos de estupro

Como especialistas já alertaram, a apresentação do do boletim de ocorrência não é uma exigência para interromper a gravidez. No entanto, o registro do crime de estupro é recomendado, já que “é importante para apuração do crime e responsabilização do autor do estupro”, afirma a promotora, que recomenda à vítima procurar uma Delegacia, preferencialmente especializada em violência contra a mulher, para registrar o crime.

Para ter acesso a uma lista de serviços de saúde no atendimento às pessoas em situação de violência sexual no Estado da Bahia, acesse o link:

http://www.saude.ba.gov.br/atencao-a-saude/abortolegal/




Fonte: Vogue

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